Portugal tem escapado a grandes catástrofes naturais. Por cá, são raras as tempestades, as cheias, os terramotos e raramente atingimos temperaturas extremas. Somos, como costuma dizer-se, um “cantinho do céu”. No entanto, há um flagelo a que não costumamos escapar. O dos incêndios florestais. A nossa floresta, o ambiente, os nossos bens e até vidas, são anualmente delapidados, ficando sempre uma sensação de alguma impotência. Não somos os únicos, contudo. Noutros países, sobretudo do Sul da Europa, acontece o mesmo. Para nem sequer falar nos países das Américas, como Brasil ou Estados Unidos, ou da Oceânia, com a Austrália. Este ano, o Governo de José Sócrates resolveu modificar algumas coisas, nomeadamente, criando uma equipa especial de profissionais, os “Canarinhos”, criando também uma empresa de Meios Aéreos e alterando um conjunto de procedimentos nesta matéria. Nas Autarquias, tem sido feito um esforço enorme. Em Gondomar, a Câmara orgulha-se de ser uma das mais elogiadas no apoio que presta às corporações de bombeiros voluntários, com verbas distribuídas para equipamento, instalações e formação. A prevenção nunca foi tão grande. Ora, apesar de todos estes esforços, é mais ou menos sabido que, quando o calor aperta, as chamas fazem estragos e o flagelo regressa. Ardem milhares de hectares de matas, morre um bocadinho do nosso Portugal. Entre as causas, aponta-se, também, a falta de limpeza das florestas e o abandono a que foi votado o Portugal rural. Mas, a verdade, é que, perante isto, e apesar das inovações feitas no campo do combate profissional aos incêndios, esta catástrofe anual continua a ser prevenida e combatida fundamentalmente por voluntários. Chamo-lhes "voluntários" porque o seu esforço e capacidade técnica torna, muitas vezes, ingrato o rótulo de “amadores”. Será injusto usar esse termo, mais depreciativo em relação aos que, muitas vezes, nos salvam a vida, sem que se faça esta ressalva. Mas, a verdade, é que o são "amadores". A nossa segurança, a nossa riqueza natural e patrimonial, a nossa prevenção, a nossa salvação, está tantas vezes depositada nas mãos de quem, com boa vontade, se disponibiliza a salvar alguns dos nossos valores mais queridos. E isso confunde-me. Não sei se com razão ou sem ela. Mas confunde-me, como é possível, num Mundo cada vez mais sofisticado e profissionalizado, que um País que apenas tem, como certa, uma catástrofe anual, que sabe bem quais são os seus contornos, “timmings” e lugares, deposite sistematicamente nas mãos de “voluntários”, o grosso do seu socorro. A sazonalidade deste flagelo não desmotiva esta minha questão. Pois, se é na “época baixa” que é possível fazer mais pela prevenção, limpando matas, desbravando terreno e sensibilizando, não seria útil, por exemplo, criar estruturas locais totalmente dedicadas a esta causa. Para que combatessem no Verão e prevenissem no Inverno? Não haverá dinheiro para isso? Quanto custa ao País, ver arder e combater todos os anos, desta forma - "amadora", os incêndios florestais? Como é possível continuarmos a combater uma catástrofe certa apenas com homens de boa vontade, obrigados a roubar aos seus patrões ou às férias das suas famílias, dias das suas vidas? E, recorde-se, apesar do “voluntariado” destes homens, que nem sabemos bem quantos, efectivamente são, os bombeiros custam ao Estado e às Autarquias milhões de euros, anualmente. Não tenho, obviamente, certezas sobre as soluções. Sabemos que o Governo parece querer mudar algo e este ano, notam-se algumas diferenças. Mas a verdade é que as condições climatéricas favoráveis não nos têm deixado avaliar convenientemente as acções que todos temos tomado no campo da prevenção e combate aos incêndios. Talvez a natureza nos esteja a dar uma folga, uma hipótese de melhorar, modificar e contribuir. Mas, em minha opinião, antes de tudo, haverá que definir o que é realmente melhor: se custear a tragédia e o seu combate, muitas vezes inglório, com voluntários, se queremos de forma mais firme, olhar este assunto como um assunto profissional, dando ao combate aos incêndios um lugar que já merece na curta lista dos “desígnios da Nação”, onde a ajuda humanitária a países distantes tem estado quase a cabeça, logo a seguir às vitórias nacionais no futebol. É que, na verdade, a questão dos fogos florestais, nunca lá esteve.
Nuno Santos
Assessor de Imprensa da Câmara Municipal de Gondomar
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